22 January 2014

E a cocada vai custar quanto?

Na contagem regressiva para a Copa do Mundo a ser realizada no Brasil, tento rejustar a minha calculadora para a realidade do país, que ficou muito mais caro no último semestre. Acho que perdi um pouco da noção dos preços e ainda levo sustos com os aumentos de última hora para ‘aproveitar’ o período.

Se ‘aproveitar’, no mundo dos negócios segundo a cartilha brasileira é sinônimo de ‘vamos meter a mão no bolso do consumidor’, a taça já é nossa mesmo antes de entrar em campo.

Fui convidado para trabalhar nos jogos, em Natal, no nordeste do país. Mas após ligar para diversos hotéis para organizar a minha estadia na terra do sol, descobri que usar a minha experiência como jornalista no exterior - incluindo a cobertura das Olimpíadas de Londres, em 2012 – vai custar mais do que quando fui enviado para trabalhar na Suíça, Rússia ou Nova Iorque.

Tudo bem que nenhuma destas três cidades tem dunas. Ou tapioca com ginga. Mas a julgar pelos altos valores cobrados, Natal deve estar importando areia e peixe.

Como não consegui muita informação em outubro, em novembro tentei novamente. Um hotel três estrelas estava cobrando R$ 240 pela diária + uma taxa de 15%. Expliquei que precisaria de um preço especial devido ao longo período solicitado (90 dias). A telefonista pediu um minuto para falar com o gerente e me deixou na linha ouvindo uma música de Luiz Gonzaga – que é pernambucano.

Quando ela retornou, disse que poderia me dar um desconto e ficaria em torno de uns R$ 6.000 por mês. Gostei da simplicidade dela, de cobrar quase 10 salários mínimos de hospedagem com a mesma naturalidade de quem me vende um picolé de gelo na calçada da Praia de Ponta Negra por R$ 1.

Mas o melhor ainda estava por vir.

Antes que eu sequer contestasse o valor, a recepcionista se apressou em acrescentar um pequeno detalhe: eu poderia fazer reservas, apenas, até a semana antes dos jogos, em Natal. Durante o período da Copa eu teria que sair ou reservar depois.

Como não entendi, tive que perguntar outra vez.

-Só aceitamos reservas para antes do período da Copa.

-Mas estou indo trabalhar. Onde fico durante os jogos?

-O Sr. Pode reservar depois.

-Mas porque não tudo junto, em um pacote só?

-É que para as semanas da Copa vamos ter uma tabela nova, mas ainda não chegou.

E mais uma vez, adorei o jeito simples de alguém dizer algo não absurdo como se fosse a coisa mais normal do mundo! Ajuste de preços durante a estadia dos clientes - e eles que se virem.

Pensei em xingar a moça. Em lembrar a ela que isso era um insulto e que atitudes como essas apenas colaboram para a imagem negativa que o Brasil tem no exterior, de um país onde todos querem tirar proveito dos turistas, dos vizinhos, até de parentes se der bobeira.

Mas deixei para lá. Ela é apenas o resultado da falta de visão e falta de treinamento. Sim, porque ninguém avisa a um cliente que ele não é bem vindo porque o preço vai subir. Na pior das hipóteses ela deveria ter sido instruída a mentir e, elegantemente, dizer que já estavam lotados até o fim da Copa. Iria até ficar mais bonito, além de educado.

Contei até cinco, agradeci pelas informações e disse que entraria em contato depois - Mas não vou porque não cabe no meu orçamento.

Como não tenho gado para colocar a venda. Não trabalho com tráfico de drogas. Não sou político e não estou planejando vender um rim para financiar a minha hospedagem em Natal este ano, no momento ainda estou repensando o convite de trabalho. Enquanto isso, sigo juntando um dinheirinho para ver se pelo menos uma cocada eu consigo comprar caso venha a trabalhar na cidade.

Sim, porque se os ambulantes seguirem a cartilha dos empresários e começarem a cobrar 10 vezes mais pelos seus produtos e serviços, vai ter banco oferecendo empréstimo e financiamento até para quem ousar em saborear a tal ginga com tapioca ou um simples picolé de gelo.

Será que isso está acontecendo nas outras 11 capitais brasileiras sediando os jogos e ninguém comenta porque virou algo comum e aceitável?



*Márcio Delgado é jornalista e reside na Inglaterra com o seu cachorro Max.

Twitter: @marcio_delgado

3 comments:

Eliade Pimentel said...

É a famosa "falta de absurdo" rs. Hj tem a inauguração da Arena. O engraçado é q nem todas as pessoas q realmente deveriam ir a trabalho foram credenciadas. Em compensação, os "babões" irão em peso.

UrbanVox said...

kaaaaaaaraaaaaaaka!!!!
Falaseeeeerio!

Ana said...

Voltei do Brasil há duas semanas e fiquei desesperada nao só com as filas nos aeroportos como claro, com o preço das coisas. Comprar comida virou artigo de luxo e até um pao de queijo com cafezinho sai mais caro do que a refeicao que eu fazia há quatro anos no intervalo de trabalho. Fiquei absurdamente apavorada!